Nos meados da década de 1990 pensei em desenvolver um sistema de guia por mapas na web. A internet estava ainda começando no formato gráfico e minha primeira ideia foi utilizar mapas raster cortados em pedaços de modo que um algoritmo pudesse juntá-los através de quadradinhos na tela do browser. Logo desisti, pois além do problema do copyright dos mapas, eu estava trabalhando com mapas vetoriais e achava a solução em raster uma coisa pobre, apesar de resolver o problema de quem apenas quisesse um guia como os que existiam em papel na época. Logo depois surgiram guias em CDROM, vendidos em banca de jornal, eram softwares proprietários e não tinham acesso à web, mas resolviam o problema, apesar de serem pouco úteis por estarem presos no desktop.
O tempo passou, esses softwares melhoraram, passaram para a web e se tornaram realmente úteis para fazer um planejamento de uma rota, no olhômetro. Mas ainda eram apenas guias, sem grande interatividade.
Foi quando o Googlemaps entrou em cena. Inicialmente apenas com as mesmas características e posteriormente com muitas melhorias. Provavelmente algum desses guias chegou a colocar imagens de satélite e georeferenciamento por endereços antes do google, não me recordo, mas foi no Googlemaps que essas características ganharam fama e o mundo leigo começou a gostar das famosas “fotos” de satélite e de descobrir lugares através do endereço. Graças a isso hoje em dia o uso do termo foto está diminuindo e estão utilizando bastante a palavra correta, imagem.
Mas o Google pensa muito além. Georeferenciamento de endereços, georeferenciamento reverso, traçado de rotas etc. O Google estava entrando no mercado de empresas de tracking, gps e transportes, por exemplo. Mas ele não quer roubar esse mercado, quer apenas que usem seus produtos e vender anúncios cada vez mais direcionados para o público alvo. Daí toda essa necessidade de georeferenciamento e agora de saber onde você está. O Googlemaps mobile/Latitude mostra onde você está e com isso a Google pode te empurrar (push) a informação que você precisa (ou a que ela imagina).
E o Google não é bobo. Sabe que para um sistema pegar tem que abrir e facilitar o uso. Foi isso que tornou o PC um sucesso (apesar do Mac) e assim foi lançado o Googlemaps API. Que nada mais é que um conjunto de funções em javascript que permitem ao programador/analista montar um mapa personalizado. Claro que o poder do Google ajudou, pois existem outras soluções de mapas na web, parecidas, que ninguém sabe que existe.
Com essa API podemos fazer muita coisa, como por exemplo georeferenciar a base de clientes de uma empresa e olhar no mapa o resultado. Uma locadora de vídeo pode ver onde seus clientes moram e até montar mapas utilizando referência temporal, ou seja, criar mapas diferentes através de uma linha do tempo para ver se a entrada de concorrentes atrapalhou ou não seu negócio.
Só que o Googlemaps API não precisa de engenheiro cartógrafo como muitos softwares hoje em dia não precisam, mas também não precisa do neocartógrafo. Qualquer bom analista de sistemas/programador pode desenvolver sistemas baseado nele. O neocartógrafo torna-se supérfluo, ainda mais que se for necessário tirar alguma dúvida mais cartográfica, só o engenheiro cartógrafo pode ajudar.
A dificuldade no googlemaps API não é cartográfica e nem matemática (onde os neocartógrafos se garantem), a dificuldade maior é justamente o javascript que eu e muitos analistas de sistemas não gostam para códigos muito grandes. Normalmente um bom analista gosta de C, Java, Pascal/Delphi e PHP, por exemplo. Qualquer linguagem semelhante ao C geralmente gostamos, como o PHP ou Java. Mas javascript é parecido com C porém foge a essa regra. E se você usa javascript e diz que é simples é porque usa só em coisas simples de formulários de html, por exemplo. No google API fica realmente muito chato esse uso. E não tem como fugir, visto que é necessário o uso de uma linguagem interpretada no cliente e não no servidor, como é o caso do PHP. Mas essa dificuldade é passageira e logo o analista passa a desenvolver rapidamente e sem problemas.
Vale lembrar que o analista de sistemas que trabalha com desenvolvimento web precisa ser “poliglota”, ao contrário de em outras áreas de desenvolvimento de sistemas. Para implementar o exemplo da vídeolocadora, é necessário saber PHP, html e javascript intimamente. E a codificação não é independente, é toda “mesclada”. Fora que muitas vezes o site onde está o desenvolvimento do sistema de mapas, necessita de soluções em JAVA ou Flash para segurança ou floreios, além de necessitar de CSS para melhor visualização.
Ou seja, a “dificuldade” não tem relação com cartografia ou matemática e sim com informática. Com isso qualquer bom analista de sistemas pode se candidatar ao trabalho e o neocartógrafo pode ser dispensado. Ah, esqueci de falar, a API tem versão em Flash, abrindo mercado para os neo-analistas.....
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Como noto que existe muitas vezes a dificuldade de enxergar onde está o neogeógrafo, montei uma pirâmide para tentar demonstrar minha visão. Vale lembrar que se um engenheiro não cartógrafo resolve fazer um levantamento, comprar bases cartográficas, escolher algum equipamento da nossa área, ele não está se tornando nem neocartógrafo e nem neogeógrafo. Na realidade esse é um problema muito antigo, pois ele está exercendo muitas vezes ilegalmente nossa profissão. Isso não tem nenhuma relação com os "neos". O neogeógrafo é aquele que manipula e faz análise de informação geográfica, e ele faz uso de GIS com bases cartográficas já prontas e funcionando perfeitamente. E são profissionais de nível superior como um médico epidemiologista. Outrora participavam de equipes multidisciplinares com cartógrafos, hoje em dia e mais ainda no futuro próximo eles não necessitam mais do cartógrafo no dia a dia. E inúmeras áreas do conhecimento tem seus neogeógrafos.
Vejam meu texto sobre O Paleocartógrafo e o Neogeógrafo para mais detalhes.
Vejam a imagem da pirâmide e estejam a vontade para opinar e acrescentar profissionais ou mudar a forma.
O usuário leigo é aquele que vê apenas o resultado final já mastigado pelo geógrafo. Claro que essa é uma visão de GIS futurístico. Um mapa por si só precisa apenas do cartógrafo.
Coloquei o neocartógrafo meio de banda....
Quinta, 23 de abril, 2009.
Depois de escrever esse post pensei melhor e agora vejo o neocartógrafo como o profissional sem habilitação que se encaixa no perfil do analista de geoprocessamento, esse sim com habilitação em alguma das duas áreas e especialização na outra.
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Depois que escrevi sobre o neocartógrafo, fiquei com a sensação de que fui injusto. Alguns comentaram sobre esse "novo" profissional e me toquei que a confusão estava formada.
Não, o neocartógrafo não é "neo", é na realidade "old". Mas antes precisamos definir exatamente o que é um neocartógrafo.
Neocartógrafo é aquele profissional, que pode ser um engenheiro não cartógrafo, ou um matemático ou um analista de sistemas, mas na realidade pode ter qualquer formação. O que vai defini-lo será sua capacidade de programar computadores, utilizando algoritmos matemáticos e o uso intensivo de soluções matemáticas. Eles existem desde os primórdios da cartografia computacional.
Em 1990 trabalhei na Complasa, subsidiária de informática da Aerofoto Cruzeiro, e meu chefe imediato era um senhor de idade, engenheiro eletricista de formação, se não me engano, e sabia muito de "neocartografia". Para ele tudo era FORTRAN, e tinha algoritmo para tudo, transformação de coordenadas inclusive. Ou seja, ele realmente entrava na área de atuação do cartógrafo. Na época ele queria passar todo o código já feito de Fortran para C, e eu entrava aí. Mas não se percebeu melhoria na velocidade de processamento e o C dificultava para ele e outros trabalharem. Logo a idéia foi descartada e não sei se algum dia foi retomada.
Conheci alguns neocartógrafos desde então, mas o único que merece nota conheci em 1999 numa pequena software house que implementava um sistema para navegação (cartas náuticas eletrônicas). Fui chamado para confirmar o que ele fazia do ponto de vista cartográfico. Ele era engenheiro formado pelo IME e era muito bom. Como ele era o líder do projeto me passava rotinas a serem implementadas, o que eu suava um pouco (pois tinha acabado de cair de paraquedas no projeto) mas resolvia o problema. Mas, depois de algum tempo ele veio conversar comigo e me mostrou a codificação que ele mesmo tinha feito para cada uma das rotinas que havia me passado e me disse que não viu nada realmente diferente na minha codificação. Fiquei profundamente irritado, pois ele não me falou que já tinha feito tudo e estava apenas querendo confirmar. A conclusão foi que apenas em rotinas de conversão para Lambert ele precisava de mim. O resto todo era matemática e informática pura...
Nos dias de hoje o neocartógrafo praticamente não precisa do cartógrafo porque ele pode utilizar bibliotecas de funções que resolvem todo o problema cartográfico.
É esse profissional que muitas vezes é arrogante e desmerece o trabalho do cartógrafo. Claro que devem ter exceções. Os antigos neocartógrafos, por outro lado, sabiam trabalhar com a gente, apesar de às vezes nem precisarem. Esses eram bons realmente.
Ou seja, o neocartógrafo atual é aquele que sabe programar computadores, conhece muita matemática e tem acesso a uma ótima biblioteca de funções cartográficas. E do jeito que a tecnologia está, eles não precisam da gente, mesmo não tendo a capacidade ou mesmo o conhecimento cartográfico dos "oldneocartógrafos".
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A primeira vez que ouvi o termo Paleocartógrafo confesso que fiquei indignado, e senti que nossos colegas geógrafos também. Mas o tempo passou e refleti sobre o assunto e posso dizer com orgulho que sim, sou um Paleocartógrafo.
Para não me taxarem de louco, explico então. Paleo dá ideia de algo velho e ultrapassado, mas prefiro interpretar como algo antigo e muito bem embasado. Seguindo esse raciocínio posso afirmar com a maior certeza que um cartógrafo NUNCA será dispensável. Claro que não somos muito mais necessários hoje em dia do que 20 ou 30 anos atrás. Isso apesar da explosão do "geouso", do GPS e do georeferenciamento de tudo. Parece um contrasenso o aumento da demanda de "geo" e o não aumento proporcional de engenheiros cartógrafos utilizados. Precisamos notar que aumentou sim a necessidade do trabalho do engenheiro cartógrafo na produção de mapas, mas o que realmente sofreu um salto colossal foi a demanda por neogeógrafos.
No caso estou definindo neogeógrafos como aqueles profissionais que irão manipular e interpretar a informação geográfica. E eles são em sua maioria profissionais de nível superior, sejam eles biólogos, geólogos, médicos epidemiologistas, agrônomos, administradores de empresa (geomarketing), profissionais de educação e física, nutricionistas e muitos outros.
Eles não atuam no nicho do geógrafo, bem, pelo menos não a maioria. Ocorre que os geógrafos gostariam de abocanhar esse mercado, assim como nós gostaríamos que todos viessem pedir nossa benção e o datum da área. Mas o mundo mudou e o neogeógrafo veio para ficar e ele não precisa da gente para quase nada, pois os softwares atuais fazem todo o trabalho do cartógrafo. Claro que sempre vai ser necessário o profissional de cartografia nas empresas produtoras desses softwares, pena que a maioria, senão todas, estão lá fora.
O geógrafo precisa fortalecer-se nas suas áreas de atuação dominantes e se infiltrar nessas novas áreas. Já o cartógrafo também pode entrar na briga, porém ele se tornará um neogeógrafo...
Qualquer outro profissional que se intitule neogeógrafo e não tenha nível superior não passa de um profissional de nível técnico, embora alguns poucos possam transcender.
Outro profissional que surgiu é o neocartógrafo. Esse sim cheio de si e desmerecendo o engenheiro cartógrafo, pois acham que por saberem programar computadores e geometria eles estão com a vida ganha. Não sei na verdade quanto tempo isso vai durar, mas tenho a sensação de que vão quebrar a cara. Os softwares evoluem, o hardware também, logo, logo o que eles fazem vai ficar obsoleto e eles não terão diferencial para qualquer analista de sistemas. Já o paleocartógrafo sempre será necessário no preparo das bases cartográficas. O nosso mercado é pequeno e cresce muito menos, mas pelo menos estamos garantidos.
Ouvi essa semana o termo analista de geoprocessamento e quem comentou falou que seria um novo profissional. Aí fiquei triste... Na década de 1990 eu me apresentava como analista de geoprocessamento e realmente eu era. Afinal, sou engenheiro cartógrafo de formação, com mestrado em sistemas e computação, ênfase em cartografia automatizada e minha vida toda trabalhei com informática, sendo que meu cargo é analista de sistemas. Sempre me vi no meio do caminho, exatamente a definição de analista de geoprocessamento e posso garantir que ainda somos raros, pois os que estão por aí sempre pendem mais para um lado.
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