A primeira vez que ouvi o termo Paleocartógrafo confesso que fiquei indignado, e senti que nossos colegas geógrafos também. Mas o tempo passou e refleti sobre o assunto e posso dizer com orgulho que sim, sou um Paleocartógrafo.
Para não me taxarem de louco, explico então. Paleo dá ideia de algo velho e ultrapassado, mas prefiro interpretar como algo antigo e muito bem embasado. Seguindo esse raciocínio posso afirmar com a maior certeza que um cartógrafo NUNCA será dispensável. Claro que não somos muito mais necessários hoje em dia do que 20 ou 30 anos atrás. Isso apesar da explosão do "geouso", do GPS e do georeferenciamento de tudo. Parece um contrasenso o aumento da demanda de "geo" e o não aumento proporcional de engenheiros cartógrafos utilizados. Precisamos notar que aumentou sim a necessidade do trabalho do engenheiro cartógrafo na produção de mapas, mas o que realmente sofreu um salto colossal foi a demanda por neogeógrafos.
No caso estou definindo neogeógrafos como aqueles profissionais que irão manipular e interpretar a informação geográfica. E eles são em sua maioria profissionais de nível superior, sejam eles biólogos, geólogos, médicos epidemiologistas, agrônomos, administradores de empresa (geomarketing), profissionais de educação e física, nutricionistas e muitos outros.
Eles não atuam no nicho do geógrafo, bem, pelo menos não a maioria. Ocorre que os geógrafos gostariam de abocanhar esse mercado, assim como nós gostaríamos que todos viessem pedir nossa benção e o datum da área. Mas o mundo mudou e o neogeógrafo veio para ficar e ele não precisa da gente para quase nada, pois os softwares atuais fazem todo o trabalho do cartógrafo. Claro que sempre vai ser necessário o profissional de cartografia nas empresas produtoras desses softwares, pena que a maioria, senão todas, estão lá fora.
O geógrafo precisa fortalecer-se nas suas áreas de atuação dominantes e se infiltrar nessas novas áreas. Já o cartógrafo também pode entrar na briga, porém ele se tornará um neogeógrafo...
Qualquer outro profissional que se intitule neogeógrafo e não tenha nível superior não passa de um profissional de nível técnico, embora alguns poucos possam transcender.
Outro profissional que surgiu é o neocartógrafo. Esse sim cheio de si e desmerecendo o engenheiro cartógrafo, pois acham que por saberem programar computadores e geometria eles estão com a vida ganha. Não sei na verdade quanto tempo isso vai durar, mas tenho a sensação de que vão quebrar a cara. Os softwares evoluem, o hardware também, logo, logo o que eles fazem vai ficar obsoleto e eles não terão diferencial para qualquer analista de sistemas. Já o paleocartógrafo sempre será necessário no preparo das bases cartográficas. O nosso mercado é pequeno e cresce muito menos, mas pelo menos estamos garantidos.
Ouvi essa semana o termo analista de geoprocessamento e quem comentou falou que seria um novo profissional. Aí fiquei triste... Na década de 1990 eu me apresentava como analista de geoprocessamento e realmente eu era. Afinal, sou engenheiro cartógrafo de formação, com mestrado em sistemas e computação, ênfase em cartografia automatizada e minha vida toda trabalhei com informática, sendo que meu cargo é analista de sistemas. Sempre me vi no meio do caminho, exatamente a definição de analista de geoprocessamento e posso garantir que ainda somos raros, pois os que estão por aí sempre pendem mais para um lado.
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Opiniões/Comentários
Marco Antonio,
Sua constatação desta nova geração de experts em Cartografia é algo que nos acompanha no dia-a-dia da empresa.
depois dos "Googles Maps e Earths" proliferarem na Internet, a maioria das pessoas com algum conhecimento de informática (sabem usar uma API) viraram cartógrafos respeitáveis.
Projeções, Datum (ou elipsóides), qualidade cartográfica ... para que ?
Este é um fenômeno que acontece em várias áreas do conhecimento, por exemplo, na Medicina.
Muitos preferem conhecer sua doença e até se auto-diagnosticar baseados na perguntas e respostas de leigos em fórum ou em um blog. Eo médico ? dispensável ...
Na prática, o que vemos como empresa, é o uso indiscriminado de soluções fajutas e quando os resultados também fajutos são conseguidos, uma volta a quem realmente domina a ciência ou trabalha de maneira séria para que ela seja empregada para solução de mapeamento.
Marco Antônio
Li teu texto e achei tudo muito interessante.
Também compartilho com suas idéias.
Quero concordar com as idéias do Amauri e reforçar que o uso indiscriminado de soluções frajutas mostrará que é preciso ter um profissional qualificado e que domine a ciência.
Inté mais!
Anderson
Sr. Marco Antonio,
O aumento no número e evolução nas ferramentas de geoprocessamento e de sensoriamento remoto facilitou demasiadamente a espacialização dos objetos e fenômenos que existem ou se realizam na superfície terrestre. Contudo, a banalização dos conceitos trabalhados pela geografia e cartografia refletem atualmente na baixa qualidade dos produtos cartográficos gerados pelos que o Sr. muito bem chama de neogeógrafos e neocartógrafos. O seu texto não é preconceituoso e não desfaz do trabalho de outros colegas profissionais, mas sim, alerta para o cuidado no tratamento com a informação espacial e a necessária capacitação dos usuários. A total desconsideração para com as normatizações e convenções cartográficas/geográficas - algumas elaboradas em comum acordo em conferências internacionais, gera verdadeiros "monstros" que algumas pessoas consideram mapas e que causam diversos problemas aos leitores ou aos usuários em campo. Muito bom texto, parabéns.
Senhores,
Descordo totalmente das afirmações acima, pois se os neogrográfos podem realizar todos os trabalhos efetuados por nós, paleocartográfos, então sim a expressão significa que somos ultrapassados e estamos a beira da extinção. Isso na sua opinião.
Peça a um neogeográfo realizar cálculos de projeções cartográficas, realizar transformações de coordenadas entre datum ou sistemas diferentes, para realizar um ajustamento e definir a quantidade de pontos de apoio para a realização de uma restituição aerofotogramétrica ou mesmo pontos de apoio terrestre para a a ortorretificarão de uma imagem, para o processamento de dados de NAVSTAR-GPS/GLONASS/GALILEU/BEIDOU-COMPASS, conseguir calcular um geóide local e assim poder ter uma melhor definição da ondulação local.
A questão do uso indiscriminado de softwares por parte dos profissionais se deve ao fato de serem meros apertadores de botões. Não discordo ao fato de que os geógrafos tem uma base de SIG, cartografia e sensoriamento remoto, nesse caso só trabalhos com imagens orbitais, mas nunca, eu disse NUNCA, eles irão entrar e conseguiram roubar a nossa área de trabalho dentro da geodesia e fotogrametria.
Agora entrando na área de SIG/Cartografia/Imagens Orbitais, nos resta o fato de estarmos um passo a frente e conhecimento temos e nos mantermos atualizados.
Abraços,
Felipe Yuri
Engenheiro Cartógrafo
Felipe, acho que você não leu direito meu texto ou está pensando apenas em alguma situação. Nunca falei que geógrafos e muito menos neogeógrafos irão roubar o trabalho do cartógrafo. O que ocorre é que cada vez mais eles precisam menos ou não precisam. Fora que seu segundo parágrafo descreve uma empresa que produz bases cartográficas, essas sim continuam firmes e fortes. Mas a tendência é a especialização, somente essas empresas devem fazer esse trabalho no futuro, não faz sentido outras empresas que apenas usem bases cartográficas permanecer fazendo alguma coisa na área. Muitas empresas de telefonia, por exemplo, recorrem a terceirizadas para fornecimento da base cartográfica para planejamento do posicionamento de antenas. Claro, empresas de porte da Petrobrás continuarão necessitando do cartógrafo diretamente e não indiretamente.
Ou seja, eu não estou falando do cenário habitual de geoprocessamento e sim do novo cenário que cresce vertiginosamente a cada dia.
Caro Marco Antonio Perna
Reenviei seu e-mail para a lista de discussão da ABEC-SP.
Lhe envio abaixo, o comentário que encaminhei junto com sua mensagem.
Abraços.
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Pessoal
Segue e-mail enviado pelo Eng. Cartógrafo, Marco Antonio Perna.
Neogeógrafo, Paleocartógrafo, Neocartógrafo, etc., etc., etc.,
Eu, pessoalmente, não gosto muito destes termos. Isso me parece mais como uma campanha de marketing. Mais ou menos como os termos para definir a sexualidade das pessoas: Heterosexual, Homosexual, Metrosexual, Neosexual, Ubersexual, etc.
Variações de um mesmo tema para definir a sexualidade de alguém.
Concordo com o Marco Antonio, que o desenvolvimento da tecnologia permitiu criar-se uma geração de Neogeógrafos. Quem acompanha as discussões das comunidades técnicas do Orkut (Geoprocessamento, Cartografia, Engenharia Cartográfica, etc.) sabe que todo dia aparece um por lá !
Porém, não concordo muito com a 'não necessidade' de Cartógrafos (por causa da tecnologia)
Eu, pessoalmente, acredito que precisamos cada vez mais de Cartógrafos !
O e-mail do Marco Antonio segue abaixo.
Saudações Cartográficas
Olá Volpi!
Eu também acho que precisem cada vez mais cartógrafos. Mas não tantos como a explosão do "geouso" permitiria à primeira vista. Esse aumento de demanda por cartógrafos é ínfima comparada com o "geouso" atual. Eu enxergo o cartógrafo na base pontuda de uma pirâmide invertida e o neogeógrafo na parte de cima, logo antes do cidadão leigo.
Olá Marco.
Peço desculpas se soei arrogante na minha colocação durante o debate do Seminário GEOWEB & GPS (http://www.mundogeo.com/seminarios/GG/) sobre Mashups e Neogeografia. Sou técnico em edificações, engenheiro cartógrafo e mestrando em C&SIG, e não iria de encontro aos interesses de minha profissão.
Só gostaria de deixar claro que, na minha opinião, criar reservas de mercado para que somente cartógrafos e/ou geógrafos possam fazer o "mapa do vinho na serra gaúcha" ou similares é subestimar a capacidade desses profissionais.
No caso de produção/atualização de base cartográfica, modelagem em SIG, cadastro técnico multifinalitário, etc. é lógico que a coisa muda de figura.
Enfim ... quando começamos a formatar a grade do seminário, há uns 3 ou 4 meses, já sabíamos que esse debate iria causar alguma polêmica, e realmente foi uma das discussões que mostrou opiniões discordantes sobre o assunto.
Um abraço.
Eduardo,
Não te achei arrogante não. Você está em uma empresa e tem que ter certo tipo de posicionamento. É diferente do comportamento que você teria num seminário promovido por uma universidade...
Mas quem foi arrogante foi um dos palestrantes de mashups... E meu texto não pede reserva de mercado. Apenas constata a existência, benéfica para nós, dos neogeógrafos e o comportamento não tão benéfico dos neoneocartógrafos. Veja meu texto sobre os old neo cartógrafos...
Olá Marco !
Interessante .... é essa a pirâmide que você imagina ?
http://www.imagebam.com/image/a8755533412144
Eu ainda acho que precisamos de MUITOS cartógrafos !
Talvez, quando a tecnologia estiver consolidada e seu uso disseminado, aí sim possa acontecer o que você diz. Menos cartógrafos e mais neogeógrafos. Mas ainda temos muito erros em bases de navegadores veiculares, muitas prefeituras cobrando IPTU com imagens tomadas de helicópteros, muita gente medindo fazenda e áreas de proteção com um GPS de navegação, e muita gente querendo fazer projeto de engenharia com imagens do google earth !
Quem gosta muito disso é o mercado ! :)
No mais, a discussão é muito salutar e contribuirã para esclarecer estes termos que a mídia faz surgir.
Espero poder encontrá-lo pessoalmente no próximo ENECART para nos conhecermos e discutirmos isso.
http://www4.fct.unesp.br/seminarios/sagec/SAGEC_programacao.htm
Um abraço.
Seria quase essa imagem da pirâmide. O usuário leigo estaria em cima apenas usando o resultado da geoanálise feita pelo geógrafo ou neogeógrafo. Eu ainda colocaria o analista de sistema entre o cartógrafo e o neogeógrafo.
[ ]s Perna
Olá Sr. Perna,
Sou um simples músico (leigo) que gosta de utilizar tecnologias
tais como GPS, Googlemaps , earth etc..
Sempre tive fascínio por cartografia (frequentei a UERJ de 1985 a 1989) e a minha pergunta é: Como está hoje em dia o posicionamento (sem trocadilhos geodésicos por favor) do engenheiro cartógrafo no mercado? Ele foi invadido por profissionais de outras áreas, como dizia-se nos idos de 1980 ( como me parece pelos e-mails desta página) , ou ainda existe uma especificidade característica intrínseca aos advindos de um curso de Eng. Cartográfica?
Agradeço a atenção. Obrigado.
P.S: Esta pergunta torna-me neo,ex,old,paleo,sub,pseudo ou philocartógrafo?
ass:Fernando Cavalcanti Roza
Fernando,
Ainda existe sim, o que ocorre é o crescimento de mercado em áreas onde outros profissionais estão aproveitando a inércia da classe para entrar.
Veja a minha postagem feita na data de hoje sobre reportagens sobre nossa área.
These are very interesting post and blog,thanks.