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Marco Antonio Perna é analista de sistemas e pesquisador, com mestrado em sistemas e computação. Desde 1997 pesquisa a dança de salão sendo o criador do portal Agenda da Dança de Salão Brasileira que no final do século 20 uniu os dançarinos brasileiros pela internet. É autor do livro "Samba de Gafieira: a história da dança de salão brasileira", do livro "Dança de Salão Personagens e Fatos" e já escreveu artigos e textos de danca de salão para os Correios e para jornais de dança como: Dança e Saúde, jornal Dance, Dance News e Falando de Dança. Também escreveu artigo para o livro da coleção "As Melhores Dicas da Dança de Salão", da editora Delprado. Participou de congressos de dança de salão e promoveu seis edições do congresso Salão Rio Dança. Como dançarino de salão teve aula com Jaime Arôxa e seus instrutores e também com João Carlos Ramos da Cia. Aérea.
A Fábula do Pássaro Dançante. Uma crítica carioca para a não valorização do Samba de Gafieira, Bolero Carioca, Lambada e outras danças brasileiras.
Era uma vez em um Reino muito, muito próximo, um pássaro que dançava. O Reino era um local mágico, com montanhas, florestas e praias paradisíacas. Em suas florestas inúmeras espécies de aves se multiplicavam. A vida era bela,
doce e alegre. Nesse ambiente nasce nosso jovem herói. Um pequeno pássaro que começa a dar seus primeiros voos. Na primeira tentativa, cara no chão. Mas nosso herói foi tentando e tentando até que conseguiu alçar seu primeiro voo. Seus amigos de mesma primavera comentavam que ele voava como ninguém. Que tinha muito estilo para quem tinha acabado de aprender a voar. Os pássaros mais antigos também notavam tamanho talento. Alguns, invejosos ficaram. Outros, felizes pela continuidade da excelente qualidade de seus sucessores.
O tempo passou e nosso herói evoluiu muito em sua arte de voar. Sua espécie era conhecida por cortejar as fêmeas com um voo dançante. Não era apenas uma dança como outras espécies de pássaros faziam, era um voo dançante. Essa característica, única entre as aves, tornava esse Reino respeitado em todos os Reinos vizinhos, cujas aves cantavam ou dançavam, mas não conseguiam
vislumbrar tamanha técnica e inventividade do voo dançante.
Pássaros e mais pássaros vinham ver o show de nosso herói. As passarinhas suspiravam a cada rodopio no ar. Quando nosso herói tirava uma passarinha para o voo dançante, todos paravam para ver tamanha beleza. Alguns se perguntavam se essa seria a escolhida, mas a dança sempre terminava em agradecimentos apenas.
Com o passar do tempo, primos de espécies próximas, vindos de Reinos vizinhos, pediam ao nosso herói aulas de voo dançante. Claro que, feliz e sem modéstia, ele não se furtava a passar seus conhecimentos. Não cobrava nada, nem um pedacinho de fruta ou inseto para matar sua fome após a aula.
As aulas eram em uma clareira, entre a praia e a montanha. Nessa clareira eles voavam e dançavam. Por essa razão os mais antigos chamavam o voo de cortejo de “voo dançante da clareira”. Existiam regras de conduta, não se podia namorar a passarinha durante o voo de cortejo, só depois, se ela quisesse. Não era permitido esbarrar em outros pássaros que estivessem realizando o voo dançante. Só era permitido uma passarinha por dança. As normas eram claras, pois o ambiente exigia respeito. Era dançar o dia inteiro, mas voando direito.
Aula após aula, quando perguntavam o nome do voo dançante, nosso herói achava engraçado e para parecer importante dizia que, como dançava ao som do mar e do vento e esses vinham de reinos europeus, a dança se chamava voo dançante europeu. Claro que para desgosto dos mais velhos de seu reino, que sabiam que o voo dançante não tinha nada de europeu, talvez a inspiração dos ventos, mas era criação daquele belo reino mesmo. Alguns ainda tentavam contra argumentar. “Mas, não é o mesmo voo dançante de seus pais e avós ?” Perguntavam. No que nosso herói ria e se calava.
Muitos anos se passaram desde que nosso herói deu seu primeiro voo. Hoje, ninguém mais vem fazer aula com ele e com mais ninguém em nosso belíssimo Reino. Os primos, que tanto vinham fazer aulas, criaram escolas de voo dançante em seus reinos e estão com as reservas de alimentos abarrotadas de tantas aulas dadas e bem cobradas. Cada Reino vizinho apregoa ser o verdadeiro representante do voo dançante europeu, que teria chegado pelos mares e ventos aos seus reinos. Alguns poucos que conheciam o nome verdadeiro chamavam o voo simplesmente de “Clareira”, pois nunca haviam entendido o real sentido do nome.
Nada do que é ensinado é diferente do aprendido com nosso herói.
Nosso herói continuava dando show para suas passarinhas e sempre com movimentos novos, mas os reinos vizinhos não mais se lembravam dele. Nenhum pássaro de fora aparecia mais em nosso belo Reino. Já cansado e doente, nosso herói perguntou a seu pai o que ele tinha feito de errado, pois não seria melhor então se tivesse cobrado pelas aulas? Seu pai, triste e resignado, responde que cobrar as aulas possivelmente facilitaria sua vida, mas as gerações futuras de qualquer maneira perderiam a primazia de tão bela dança. “Por que, pai?” Pergunta nosso herói, no que recebe de resposta: “Amado filho, cobrar resolveria um problema momentâneo de fome, mas quando você repudiou o nome e a origem de nossa mais bela dança você deu carta branca para que nossos vizinhos se tornassem donos dela também. Eles não são tão criativos como nós, mas são organizados e disciplinados, era uma questão de tempo até que deixassem de lembrar que existimos”.
Nosso herói morre jovem, de doenças provocadas por dançar e voar sem se alimentar direito. Passarinhas ele teve diversas e estas mesmas levaram seus ninhos e estoque de alimentos deixando-o na miséria. Triste é o fim do artista que não sabe valorizar seu patrimônio.
Publicado no jornal Falando de Dança 87 em dezembro de 2014: http://issuu.com/dancenews/docs/ed_87_completa_para_leitura/5
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